quinta-feira, dezembro 18, 2008

ESPELHOS DO MEDO - Um terror bem acima da média

Fico um pouco assustado com filmes de terror, propriamente dito. Mas não assustado de medo ou pavor; embora o objetivo de um bom filme de terror, seja isso... mas como hoje já sou crescidinho e não preciso mais dormir de luz acesa (rs), o meu medo na verdade advém da ausência de um bom roteiro, de um bom desenvolvimento da trama (que mesmo que lhe pregue sustos, te deixe envolvido com a história) ou até mesmo da falta de criatividade que uma boa parte dos filmes de terror atual sofrem. Hoje o gênero quase sempre segue - lamentavelmente - a mesma fórmula: espíritos atormentados que começam a assustar o mocinho e a mocinha - ou suas famílias - até que os protagonistas consigam achar um jeito de livrar as almas tortuosas do sofrimento eterno. Convenhamos, essas sinopses já estão um pouquinho batidas e só desanima ainda mais quando acrescentadas por elementos mais batidos ainda, que sempre vem junto com o pacote! São eles: crianças aterrorizadas, velhinhas enigmáticas ou mesmo medonhas, uma maldição milenar que assombra o local ou alguém, e agora, também importado do Terror Asiático, ainda temos que ver inúmeras vezes menininhas cabeludas que saem de dentro da banheira, de baixo da cama ou que descem do teto como uma aranha. Mas com toda a sinceridade, nada que me faça desistir do filme... desde que o mesmo possua a boa e velha história MUITO BEM CONTADA. E nesse ponto, Espelhos do Medo não só cumpre essa função, como ainda consegue provocar autênticos arrepios!


Kiefer Sutherland (o famosíssimo Jack Bauer, da ótima série policial 24hrs), volta aos cinemas na pele de Benjamin Carson, um sofrido vigia noturno que além de enfrentar um relacionamento conturbado com sua esposa (eles estão quase se separando), ainda precisa superar o fracasso de sua carreira policial, curar sua bebedeira e para piorar, convencer a todos que os espelhos andam se comunicando com ele! Tudo bem, eu sei que parece muito exagerado... e é, à primeira vista. Mas o roteiro é esperto e mesmo criando clichês do gênero, sempre procura fugir deles da maneira mais empolgante possível. A propósito, é interessante comentar que o diretor espanhol Alexandre Aja (também roteirista do filme!) é novato na direção, mas cumpre muito bem seu papel, fornecendo pistas e enquadramentos muito bem feitos, como as tomadas sutilmente elaboradas para nos mostrar imagens espelhadas onde menos imaginamos, como no assoalho bem encerado de uma casa, na mesa bem envernizada, em retrovisores de carros, nas poças de águas e até mesmo na lataria de um brilhoso automóvel. Sinais pequenos, mas genialmente subliminares, de que os reflexos estão nos acompanhando. E para piorar - ou melhorar! - o clima de suspense do filme, os espelhos são um show à parte, sendo muito bem focalizados com a exata dimensão de como eles surgem em cena, sempre repentinos, imponentes e tenebrosos. É certo que ficamos com MEDO só de encarar aqueles vidros!


Embora, seguindo a velha cartilha para se criar sustos (como a música mais acentuada, gritos de pessoas, sequências de fobia), Espelhos do Medo se desenvolve de forma sempre tensa, nunca dando-nos a chance de respirar e ainda convence em seu propósito natural de colocar os protagonistas que simpatizamos, como as grandes vítimas do inimigo fantasmagórico. E não falo só do vigia noturno Ben Carson, que nos fornece toda a vontade de torcer para que ele vença aqueles desafios, mas sim, de sua esposa e de seu casal de filhos pequenos. E é ainda mais angustiante nos deparar com crianças completamente ingênuas e que não fazem a menor idéia do mau que está diante deles, ainda sofrendo todos os riscos possíveis. E dentro desse contexto, tenho que parabenizar a atriz Paula Patton, que faz Amy Carson, a esposa de Ben, que atua de forma coerente e sensata, exibindo seu desespero de maneira convincente, como uma mãe exibiria ao ver seus dois filhos pequenos sendo ameaçados por aquilo que ela não entende! Patton, inclusive, me lembrou em alguns momentos a atriz Halle Berry!


Mas o ponto forte de Espelhos do Medo reside mesmo na explicação de como tais espelhos tornaram-se assombrados; uma explicação muito criativa e interessante, que mesmo sendo contado de maneira sobrenatural, ainda assim, possui a excelente habilidade de nos ter parecido lógica e real. E mesmo que o protagonista principal do filme, o ótimo Kiefer Sutherland, ainda lembre seu herói Jack Bauer de 24hrs (o que é inevitável, tamanha foi a dedicação do ator ao personagem da série!), ele ainda nos surpreende em alguns bons momentos de interpretação, como no choro esbravador dentro de um banheiro diante da morte de um personagem e quando tenta por todas as maneiras eliminar os espelhos da própria casa e convencer a esposa, ainda incrédula, de que não está louco e o que enfrenta é mais sinistro do que se pode imaginar.


Mas depois de tanta correria, apreensão e medo, a surpresa maior do filme é revelada em seus últimos segundos antes do término, quando finalmente, descobrimos que algo mais aconteceu... e é também nesse momento que sentimos que Espelhos do Medo não será uma obra prima incontestável dentro do gênero, como foi O Sexto Sentido ou Os Outros, mas mesmo assim, será lembrado como um filme perturbador e muito angustiante, com um final que consegue jogar - com sagacidade! - sua última carta.


*NOTA 7


PS: Para os mais impressionados, o filme nem tem tantas cenas assim de terror "brabo", mas a que envolve a morte de uma mulher na banheira, aconselho pelo menos, a piscarem rápido! (rs)

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segunda-feira, dezembro 15, 2008

O CAÇADOR DE PIPAS - Melancolicamente bonito

Há filmes que nos despertam alegria, outros nos despertam revolta e há ainda aqueles que nos fazem refletir; sobre muitos aspectos em nossas vidas. O Caçador de Pipas está nessa última categoria... mas mesmo que ele tenha como mensagem principal a reflexão à respeito de nossos atos, é também um filme que nos provoca certa revolta e certa alegria em alguns de seus momentos mais intensos.

Para começar essa crítica, é necessário dizer que não estamos diante de um típico filme hollywoodiano.
O Caçador de Pipas - inspirado num Best Seller homônimo escrito por um Palestino - abrange a amizade, a honra paternal, a tradição da família e da cultura paquistanesa e afegã e, principalmente, o quanto de devoção estamos disposto a dar aos sentimentos e à consideração humana. E é nesse quesito, das emoções e da tolerância e aceitação, que o filme conquista qualquer um... e o fato de que durante toda a projeção, não vemos sequer nenhum rosto ocidental e muito menos qualquer participação de atores americanos, já faz com que acreditemos que essa obra superou grandes desafios de público e, por isso mesmo, já merece notórios elogios pela qualidade que manteve em sua lição!

Amir Jan é um menino mimado e frágil, criado com todas as regras e leis que seu pai, um rígido e honrado paquistanês de posses, foi capaz de lhe transmitir. Hassan é um menino afegão, filho do empregado do pai de Amir, que nunca teve tantas oportunidades de futuro, mas que vivia o presente com força, alegria e, principalmente, muito caráter. Apesar de diferentes no jeito pessoal e social, Amir e Hassan viviam juntos e se divertiam juntos, compartilhando uma brincadeira em comum que os unia ainda mais: a tradicional disputa de pipas na região.

O problema é que Amir, o menino rico, parecia não mergulhar de verdade na amizade a qual Hassam, o "Hazara" (termo preconceituoso que definia os afegãos), sempre o demonstrava. E foi durante uma impiedosa cena, em que Hassam é a vítima, que começamos a compreender o jeito ingenuamente covarde do menino rico, quando este se omite a ajudar o amigo. Depois disso, uma crescente rebeldia sentimental domina o fraco Amir, pela situação que o colocou como testemunha passiva e prostrada do mal que fizeram com o bonsodo Hassam, e cada vez mais, os dois vão se afastando fisicamente... e moralmente. Anos mais tarde, vemos Amir vivendo na América como um bem sucedido escritor de livros enquanto que Hassam continuou no Afeganistão, com todas as sua dificuldades.

O filme começa de maneira lenta, mas envolvente, para mais tarde, revelar que depois da ocupação Russa no Afeganistão, não só a política do local mudou, como os sentimentos dos próprios povos das regiões vizinhas foram transformadas, um contra os outros. A cidade na qual Amir e Hassam viviam, tornou-se um acúmulo de destroços, demarcando os territórios liderados pelas milícias afegãs. Mas é na volta "forçada" de Amir ao local de origem, que muitas descobertas começam a tomar forma, até que o mais bonito acontece: o jovem adulto Amir percebe o quão errado foi com Hassan e está mais do que nunca disposto e propenso a querer melhorar... afinal, não se trata apenas de um pedido de "desculpas" em atos feito por Amir, mas sim, de tentar ao menos, dar um futuro melhor para uma nova criança que ele pretende agora salvar. E que, assim como foi com Hassan, seu melhor amigo, este novo menino só precisa de alguém que o dê mais esperanças!

Dirigido com muita delicadeza por
Marc Foster (diretor alemão que recentemente comandou a nova produção de 007), o filme ganha na ótima trilha instrumental, na fotografia sutil, porém, marcante e, principalmente, na forma simples e direta das interpretações de todos os atores - não ocidentais - envolvidos nesse belo projeto. E se um filme precisa lançar uma mensagem bonita dentro de um contexto triste sem ser piegas ou clichê, O Caçador de Pipas, é com certeza, um dos melhores representantes!

*NOTA 8


PS: A realidade das crianças paquistanesas e afegãs, vítimas dessas guerras absurdas e desse conflitos imbecis por terra e religião, torna-se um agravante ainda maior do que analisar as ideologias, políticas e crenças desses povos que parecem só pensar em brutalidade do que na humanidade de seus próprios semelhantes. E se, já é doloroso testemunharmos muitos daqueles meninos com fome, amontoados em alojamentos improvisados ou escondidos em galpões e escolas, é ainda mais doloroso saber que alguns deles ainda são pegos por sheiks ou líderes de grupos terroristas para servirem como "distração" ou serem treinados para virarem futuros soldados. E esses meninos aceitam... apenas para não morrerem!

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